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Às vésperas de estrear no streaming, Eliana fala sobre família, vaidade e sexo: "Transar é fundamental"


Quando surgiu na TV, nos anos 1990, Eliana Michaelichen Bezerra disputava a atenção do público infantil com Xuxa e Angélica. A guerra era pesada. A apresentadora da TV Globo descia de uma nave espacial todas as manhãs. Já a da extinta TV Manchete desfilava vestidos dignos de princesa da Disney. No SBT, Eliana sacou que precisava encontrar um caminho rápido para continuar na batalha. Resolveu virar a amiga mais velha das crianças e investir numa linha mais educativa. A famosa música “Os dedinhos” surgiu porque o programa não tinha cenário e ela aparecia só da cintura para cima, mas a canção e a coreografia ajudavam o público a desenvolver a coordenação motora fina.

Hoje, aos 47 anos, Eliana tem uma das carreiras mais sólidas da TV brasileira. É a única mulher que comanda uma atração, o “Programa da Eliana”, no competitivo horário das tardes de domingo. Ainda no primeiro trimestre de 2022, estreia no streaming, como apresentadora do reality “Ideias à venda”, uma competição entre empresários ousados na Netflix.

Nos negócios, por sinal, está sempre a par de tudo. Como não tem empresário, acompanha todas as transações relativas a licenciamentos, campanhas e merchandising. E ainda dá conta da criação dos filhos Arthur, de 10 anos, de seu casamento com o produtor musical João Marcelo Bôscoli, e Manuela, de 4, do seu relacionamento com o diretor Adriano Ricco.

Em uma conversa por telefone, a apresentadora fala sobre a educação dos filhos, a imagem de mulher certinha e, claro, trabalho.

Você é a única apresentadora da sua geração que segue firme na TV aberta. O que fez certo?

Diria que soube fazer a transição do público infantil para o adulto na hora certa. Acho que também não abandonei totalmente as crianças. O meu programa hoje é para a família toda. As pesquisas dizem que 70% do meu público é feminino, predominante na faixa de 30 a 40 anos, mas eu também quero agradar senhoras e crianças. Acredito que eu também tenha ousado mais. Em 2005, produzi e protagonizei o filme “Eliana em o segredo dos golfinhos”. Fui para o México com uma equipe de mais de cem pessoas na cara e na coragem. O longa ficou entre os 10 mais vistos. Depois de mais de 11 anos de terapia, diria que um traço marcante da minha personalidade é a inquietação. Não é fácil surgir jovem e envelhecer na TV.

Você buscou a terapia para lidar melhor com a passagem do tempo?

Não foi bem isso. Cursei Psicologia até o terceiro ano e, realmente, acho que todo mundo deveria fazer análise para lidar melhor com a vida, com as cobranças…

Mas já foi cobrada por envelhecer na TV?

Antigamente, essa cobrança era mais forte. Vejo o envelhecimento como sinal de vida. Só envelhece quem está vivo, né? Há 10 anos, todo mundo apontava o dedo para celulite, para a ruga da outra. Hoje, percebo uma rede de apoio.

Você já teve síndrome da impostora?

Siiimmm! (risos) Claro que já caí nesta armadilha, mas a gente é o que é possível ser. Não é possível ser boa profissional o tempo todo, nem mãe, nem estar linda 100%. Nada melhor do que a maturidade para entender isso.

Como é a Eliana chefe? faz o tipo cri-cri?

Olha, eu diria que sou bem exigente, mas também sei respeitar os funcionários. E contratei bons profissionais. Nunca precisei gritar ou humilhar alguém para me impor. É claro que vivemos numa sociedade machista e patriarcal. Sou filha de nordestino, e, se precisar puxar a peixeira para me posicionar, eu vou puxar! (risos) É uma luta. Sou a única mulher trabalhando no domingo, não foi fácil chegar até aqui.

As mulheres do mercado financeiro dizem que, se fossem homens, o caminho delas teria sido mais fácil. Você também sente isso?

De uma maneira geral, a mulher é sempre subestimada, né? A cobrança para o nosso lado é sempre maior. Sinto que tenho que provar que estou fazendo por onde para ganhar o que ganho. O salário das mulheres ainda é menor do que o dos homens.

A era dos grandes salários parece estar no fim. Sairia da TV aberta para comandar uma atração num canal de streaming?

Eu procuro sempre me manter atualizada na minha área. O meu programa tem um quadro que partiu de uma sugestão minha. Pedi para ir a uma feira de TV em Cannes, na França. Lá, vi o quadro, apostei que seria bom e acertei. Hoje, o “Minha mulher que manda” (uma disputa culinária entre casais em que a receita é passada apenas para a mulher) é um grande sucesso. Não sou do tipo acomodada. Agora mesmo, fui chamada para apresentar um programa de empreendedorismo na Netflix. Fiquei muito lisonjeada com o convite. Sinal de que eles me veem como uma profissional eclética.

Você está com 47 anos. Teme passar por alguma crise ao chegar aos 50?

Olha, não tive questionamento aos 30. Quando completei 40, também não. Então, acho que não vou sentir. Acho que tem muito mais a ver com a cabeça. Eu, aos 28 anos, fiz uma plástica e uma lipo. Sei que cada um tem o direito de fazer o que quer com o próprio corpo, mas, hoje, não faria de novo. Diria para aquela Eliana: você é linda do jeito que é. Não precisa fazer nada disso.

Mas hoje você gosta de fazer procedimentos estéticos, não?

Faço botox e lasers. Uso a tecnologia ao meu favor. Quero envelhecer com dignidade, sabe? Eu sinto o maior tesão em malhar. Tenho celulite, faz parte. Vejo minhas ruguinhas no vídeo, e tudo bem. Acho que a maturidade traz essa paz. Antes de a minha filha nascer, precisei parar tudo e ficar em repouso absoluto por cinco meses. Ali, uma ficha caiu.

Como você educa o Arthur e a Manuela? É liberal?

Olha, educar não é uma tarefa fácil. Dizer “não” é muito difícil, mas é preciso. Tenho condições de proporcionar tudo do bom e do melhor para eles, mas não quero que pensem que tudo é fácil, entende? Muitas vezes, queria comer um iogurte e a minha mãe dizia “não” para mim. Ela negava porque a gente não tinha dinheiro para comprar. Tenho dinheiro, mas não posso deixá-los crescer com a ideia de que podem ter o brinquedo da moda a hora que quiserem. É uma equação complicada.

O que não repetiria na educação que teve?

Bater nos filhos. Não que tenha apanhado muito. Acho que foram três episódios, no máximo, mas me marcaram muito.

Você era muito levada?

Adorava brincar na rua ou na casa de algum amiguinho. Tinha hora para voltar para casa e, às vezes, me atrasava. Minha mãe ficava muito braba. Ela até já me pediu desculpas por isso. E tudo bem. Ela foi criada assim, minha avó foi criada assim. Hoje está mais do que comprovado que o diálogo com os filhos é melhor.

Seu pai continuou a trabalhar como zelador mesmo quando você já era famosa?

Ele era zelador, mas vendia carros e apartamentos. Um dia, me falou que tinha um bom investimento no prédio. Comprei o apartamento para eles. Ele descia para trabalhar na portaria. E minha mãe lavava e passava as roupas dos vizinhos. E sempre fizeram questão de continuar trabalhando.

Você sempre teve a imagem de mulher certinha. Nunca se incomodou com isso?

Eu me orgulho muito da minha carreira, da minha história, de tudo o que passei. Já me separei algumas vezes, tive filhos de pais diferentes. Para uma sociedade machista como a nossa, acho que não sou tão certinha assim...

Como encara a fidelidade no casamento?

Eu acho que cada casal tem a sua regra. E cada relacionamento vai se renovando. Antigamente, eu tinha uma visão muito romântica. Depois, com a maturidade, você saca que o bacana de estar junto é não depender do outro. A vida a dois não é nada romântica. Tem altos e baixos, tem individualidade, tem que respeitar o outro, tem que encarar a felicidade do outro, mesmo quando ele está longe de você…

Você namorou Luciano Huck e Roberto Justus. Com a sua cabeça hoje, você os namoraria de novo?

Tudo o que o vivi faz parte do que sou hoje. Tu-do! Eu tenho carinho pela minha história, pelas pessoas que passaram pela minha vida. E está tudo certo!

Sexo para você é importante?

Eu diria que é fundamental! E, falando das novas gerações, essa visibilidade do prazer é um direito. Sempre foi tabu para a mulher falar sobre sexo. Tenho uma irmã que é 10 anos mais velha. Essa discussão era transparente em casa. Sempre conversei com ela e com a minha mãe. Prazer nunca foi um tabu. Era uma conversa que precisava existir. Minha mãe entendeu que ela era a melhor pessoa para conversar com as filhas abertamente sobre tudo. Cresci em um ambiente em que a mulher pode e deve ter prazer. A gente merece gozar nesta vida da maneira que a gente quiser.

Nota publicada por Ela - O Globo

 

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